segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Diálogo com o passado




É patente que o debate comparativo entre a produção cinematográfica recente do País e aquela realizada pelos idealizadores do Cinema Novo tornou-se inevitável, à medida em que retornaram às telas as temáticas sociais e os espaços de ambientação centrais do cinema brasileiro dos anos 60, bem como a representação de traços identitários da cultura - carnaval, futebol, candomblé e folclore nordestino.


No entanto, é imperioso ressaltar que, para além dos traços comuns, é na proposta estética desses dois cinemas que serão identificados seus antagonismos. Por meio de seu projeto estético e ético, os filmes emblemáticos do Cinema Novo apresentaram uma concepção revolucionária em sua linguagem: proposição do corte seco, não linearidade da narrativa, ênfase aos aspectos prosaicos da vida cotidiana, numa recusa total aos padrões impostos pelos grandes estúdios. Como explica Ivana Bentes (1999: 87):


Nesses filmes, clássicos, criou-se uma estética da crueza e do sertão, trabalhada na montagem, no corte seco, no interior da imagem e do quadro, na luz estourada, na fotografia contrastada, no uso da câmera na mão, em todos os níveis da narrativa. Estética cinemanovista que tinha como objetivo evitar a folclorização da miséria e que colocava uma questão fundamental: como criar uma ética e uma estética para essas imagens de dor e revolta?

Em contrapartida, depreende-se da produção contemporânea, que os cineastas da Retomada retratam o sertão e a favela sob um novo olhar, retomando o padrão das narrativas clássicas dos tempos da Vera Cruz. O requinte proposto ao público no tratamento da imagem ou na confecção do roteiro faz com que o cinema da Retomada se reconciliasse com a tradição do filme de mercado, caracterizada pelo bom acabamento técnico, quase publicitário, e pelos filmes de gênero da indústria - que correspondem ao modelo americano de entretenimento.


Nota-se, portanto, que o cinema da Retomada segue uma tendência mundial de trazer as margens para o centro da discussão, dando ênfase ao multiculturalismo. Ângela Prysthon chama a atenção para o fenômeno (2003: 3):


Esse processo cosmopolita vai ter influência na constituição dos mercados culturais mundiais contemporâneos que se abrem, então, ao multiculturalismo e aos efeitos de uma cada vez maior presença de bens simbólicos periféricos (produzidos por camadas subalternas da sociedade) junto à cultura de massa internacional e que se fazem sentir em todos os cantos do planeta, especialmente desde o início da década de 80.


Posta por ELICLEIA OLLVEIRA fonte:Cinema brasileiro da Retomada: da pobreza à violência na tela

Nenhum comentário: