A entrevista do Secretário Estadual da Segurança Pública, César Nunes, publicada com exclusividade na edição dessa quinta-feira(22), de A TARDE, gerou desde discursos concordantes até ataques a suas palavras.
Dirigentes de entidades de direitos humanos acreditam que ele contribuiu para acirrar a violência, dando uma espécie de licença para matar aos policiais.
Em Feira de Santana, as declarações do secretario gerou revolta e motivo de gozações no meio policial. “Acho que o secretário não vive o nosso dia a dia, dizer que andamos por ai atirando para cima, nem munição ele tem nos fornecido, como é que vamos dar tiros por ai,” declarou um policial civil que não quis se identificar.
“Olha o secretário deve está se referindo a alguma policial que não deve ser os da Bahia, pois há muito tempo que não temos viaturas nem munição para andar ligando sirenes e dando tiros para o alto, a não ser que ele esteja para nos dar novas viaturas e quer que apartir de agora nós nos comportemos assim,” ressaltou outro policial.
PARTES DA ENTREVISTA AO JORNAL A TARDE
Após a queda dos líderes, a disputa pelo domínio do tráfico de drogas estaria por trás dos alarmantes índices de homicídios na capital baiana. É a explicação do secretário da Segurança Pública, César Nunes. Em entrevista exclusiva ao repórter SAMUEL LIMA do Jornal A TARDE.
A TARDE Como explicar o aumento dos homicídios na Grande Salvador entre 2007 e 2008?
césar nunes Acreditamos muito que entre 80 e 85% dos homicídios tenham origem no tráfico de drogas, uma guerra intestina que está havendo entre o terceiro e quarto escalões dessa atividade ilícita. Estamos vendo a situação. A polícia cuida apenas dos efeitos, as causas têm que ser resolvidas de outra forma.
AT E onde está a origem dessa "guerra intestina"? Quando ela se intensificou?
Depois da prisão dos líderes do tráfico na Bahia, dos gerentes, ela se intensificou muito este ano. Isso vem desde as tentativas de retomada dos pontos de tráfico da quadrilha de Piti (Eberson Souza Santos, morto pela polícia em 2007). Isso é fato. Em seguida, desarticulamos o bando de Perna (Genilson Lino da Silva), terminamos o reinado dele e o pessoal de (Cláudio Eduardo) Campanha ganhou força. Aladim (Renildo Nascimento) se fortaleceu, vieram aquelas três chacinas para amedrontar. Agora, com a prisão deles e desarticulação dos comandos, os terceiro e quarto escalões começaram a agir em busca do domínio do tráfico, gerando essa violência toda.
AT Quais seriam, então, os integrantes desses terceiro e quarto escalões do tráfico?
cn Aí é que nós precisamos identificá-los. Justamente aqueles jovens que vão ascendendo. Não adianta a gente ficar aqui querendo tecer nenhuma teoria sociológica sobre o assunto, mas a realidade é essa. A polícia cuida dos efeitos, as causas têm que ser cuidadas de outra forma. E é nesta outra forma que eu acredito muito, no Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania), porque nós só vimos até hoje fazer segurança pública como polícia. Eu digo sempre: eu não sou secretário de segurança pública, eu sou secretário de polícia. Pois o único poder que eu tenho é o de fazer polícia e não segurança pública. Segurança pública nós vamos ter quando tivermos ações sociais nas grandes áreas de conflito, ruas asfaltadas, coleta de lixo, esgoto, opções de trabalho, oportunidade de educação para todos esses jovens que aí estão. Qual é o referencial de um jovem hoje desses bairros nossos de periferia? É o traficante, é o cara que chega ali com um celular novo, um par de tênis mais novo. É isso que nós precisamos mudar.
AT E há alguém mais poderoso por trás de traficantes como Perna e Cláudio Campanha?
cn Não temos indícios disso. O mais poderoso era Campanha, enquanto estava solto, pois tinha controle total da organização dele. Inclusive, a Justiça já deu o perdimento do sítio que ele comprou e no qual estava escondido em Fortaleza (CE), quando foi preso, pois ficou provado que o sítio foi comprado com dinheiro oriundo do tráfico de drogas. É isso que temos que fazer, atacar o lado financeiro dos traficantes.
AT E quanto aos rumores de relação entre bandidos da Bahia e facções de outros Estados?
cn Isso é fato. Eles mantinham relações com o PCC (Primeiro Comando da Capital, organização criminosa paulista), que fornecia as drogas. Só que o PCC não comandava ninguém aqui na Bahia, as lideranças das quadrilhas de traficantes ficavam com Perna, Campanha... Por exemplo, a apreensão de armas de grosso calibre, encontradas com um pessoal que voltava da Ilha de Itaparica, em abril. Aquele grupo emprestou as armas ao pessoal do PCC, que veio à Bahia para cometer assaltos a banco. Existe mesmo um intercâmbio, este é o termo correto.
AT Os primeiros dias de 2009 prenunciam mais um ano violento. Quais os planos da Secretaria da Segurança Pública para reduzir os índices de assassinatos na Bahia?
cn Acreditamos muito nessa nova estruturação da Polícia Civil, com essa lei orgânica que está na Assembleia sendo votada hoje (anteontem), onde já está prevista a criação do Departamento de Homicídios, com uma nova estrutura, uma estrutura maior, mais eficiente, mais eficaz no combate a esse tipo de atividade. Não existe prevenção para homicídio. O homicídio que pode ser investigado de imediato é aquele passional, que é quando existe uma premeditação. O que tem que haver é uma investigação competente, policiais capacitados nessa área de investigação, aliados com a inteligência policial. Com essa nova estrutura, podemos conseguir dar uma boa resposta a esse crime que vem assolando a nossa cidade.
AT Os policiais continuarão amedrontados em 2009, em decorrência dos assassinatos em que figuraram como vítimas em 2008? Quais as respostas a serem dadas pela secretaria neste aspecto?
cn Se algum policial estiver amedrontado, me chame para sair junto com ele para nós trabalharmos na rua juntos. Não acredito que tenha algum policial amedrontado. Muito pelo contrário: o que vimos foi a polícia como um todo - a Militar, a Civil - partir para cima. Nós partimos em 2008 para uma polícia pró-ativa, nós fizemos uma polícia proativa. E não ficamos aguardando. Nós estávamos, sim, acomodados. Hoje não mais. Nós estamos partindo para cima, por isso que fizemos a Big Bang, a Pégasus, e tantas outras operações que resultaram muito positivamente.
AT Em 2008, foram 65 autos de resistência, totalizando 105 mortes, na capital e Região Metropolitana. Este ano, já são seis mortos em quatro ações. Acha que as ações da polícia têm sido mais violentas, talvez até motivadas pelas perdas de colegas?
cn Creio que não. Creio que a violência que aí está é que gerou justamente esse maior número de autos de resistência. Os bandidos estão enfrentando mesmo. Ou nós partimos para cima... não podemos nos acovardar. Partimos para cima sempre, com segurança, com a certeza de estarmos cumprindo as leis. Porque, se tem que tombar, que tombe do lado de lá, não vai tombar do nosso lado, não. Que tombe do lado dos bandidos, mesmo. E a polícia não se acovarda, não, a gente está partindo para cima mesmo.
Posta por Jorge Magalhães